A afirmação da cidade e do homem urbano é um fenómeno consolidado no século XXI. O grande protagonismo das cidades e do modo de vida urbano é um processo que tem início em tempos imemoriais, no entanto, o surgimento das grandes metrópoles urbanas e o consequente estabelecimento de um modo de vida urbano próprio, independente e sustentável teve o seu grande “boom” logo após o fim da segunda guerra mundial. Este fenómeno coincide com a criação da sociedades de consumo que desde aí vem modelando o nosso modo de vida e estabelecendo novos padrões definidores do nosso modo de vida contemporâneo, padrões estes que se estendem por vários domínios, desde o económico, ao cultural e artístico, ao desportivo e educacional, etc.

Já tendo passado mais de uma década desde que se iniciou o novo século, tempo suficiente para que todas as dúvidas sobre o século que estamos a viver se tenham dissipado, creio que estamos a assistir a uma nova (r)evolução(?) da nossa paisagem urbana. As cidades, conotadas como pólos ativos de desenvolvimento e motores de economias pujantes e definidoras, estão a transformar-se em pólos festivos, onde o imperativo do espetáculo e do divertimento sobrepõe-se a todos os outros e de alguma forma molda a sua função e o seu estatuto.

A fruição do prazer e da diversão por quem visita uma determinada cidade tornou-se o grande objetivo de quem as gere, relegando para categorias secundárias outros objetivos que dávamos como imutáveis. A cidade está a tornar-se “não-produtiva” onde a lógica do parque de diversões e do shopping center impera e onde os seus habitantes têm de se sujeitar aos ritmos e modos de vida de quem os visita e usufrui momentaneamente.

Vários sintomas evidentes caracterizam este estado de que vos falo. Os bairros antigos são requalificados e os seus edifícios remodelados ao invés de se investir em nova construção, terrenos baldios são recuperados e transformados em espaços culturais e comerciais, antigos mosteiros e fábricas desativadas são transformados em hotéis de charme e centros comerciais, edifícios e avenidas icónicas das grandes cidades convertidas em lojas de luxo pensadas para abordar os consumidores em todas as suas dimensões sensoriais e físicas. O “entertainement” das massas impera e reduz a pó preocupações de outrora relacionados com a vivência da sua população ativa.

As cidades assumem-se como manifestações espetaculares onde o lúdico impera e tudo se faz para transmitir um ambiente de encantamento e de afastamento do “mundo real”. Julgo que a palavra “dramatização” traduz bem tudo aquilo que disse atrás. O espaço público dá lugar ao espaço comercial e molda a face da cidade. São as novas cidades do século XXI.

Entra agora a “moral a história”. O que é que isto significa? Isto é bom para o turismo? É bom para as pessoas? Ou pelo contrário, caminhamos num rumo perigoso que pode levar ao desaparecimento da cidade?

Creio que se trata de uma evolução. A globalização deixou de ser uma ideia, um sonho e é real, e isto é um sintoma da sua prática ao longo deste início do século XXI. As cidades são repositórios de cultura e a crescente procura das suas vivencias, memórias e passados só pode ser salutar para quem gosta de viajar. As cidades passam a organizar-se em torno da nossa satisfação enquanto turistas, enquanto curiosos, e adaptam a o seu ritmo às nossas expetativas. Mas a perspetiva da cidade se transformar num núcleo “não produtivo” julgo ser descaracterizadora e “artificializante”. Creio que a longo prazo não será benéfico para ninguém e eventualmente poderá levar a que repensemos a cidade de uma nova forma, desta vez levando em conta todas as variáveis que a equação urbana deverá conter para ser sustentável e, acima de tudo, gratificante e generosa para quem lá vive. Será um voltar ao “ponto zero”, um reinício com todas as coisas boas e más que poderá trazer, mas será sempre um processo custoso e doloroso até atingir o seu equilíbrio.

Exibições: 130

Adicione um comentário

Você tem de ser membro de MyGuide para adicionar comentários!

Entrar em MyGuide

COMUNIDADE MYGUIDE

O Myguide.pt é uma comunidade de Viagens, Lazer e Cultura.

Regista-te e publica artigos, eventos, fotos, videos e muito mais.

Sabe tudo sobre o Myguide aqui

Editores em destaque

EM DESTAQUE

Eventos em Destaque

Abril 2024
DSTQQSS
123456
78910111213
14151617181920
21222324252627
282930
       

Notícias

Aulas regulares (e para todos) no Museu do Oriente

Criado por MyGuide 5 Jan 2021 at 10:16. Actualizado pela última vez por MyGuide 5. Jan, 2021.

Pintar como os grandes

Criado por Agenda MyGuide 24 Nov 2020 at 18:30. Actualizado pela última vez por Agenda MyGuide 24. Nov, 2020.

É um restaurante?

Criado por Agenda MyGuide 9 Nov 2020 at 11:32. Actualizado pela última vez por Agenda MyGuide 9. Nov, 2020.

© 2024   Criado por MyGuide S.A. Livro de reclamações   Ativado por

Crachás  |  Relatar um incidente  |  Termos de serviço