Estavam 13 graus lá fora e a floresta passava sacolejante à janela, a 20km hora, por entre véus de neblina. Agosto ria-se de nós enquanto as palavras “estrada florestal” que tinhamos lido no mapa antes de começarmos a descer a serra, ganhavam um significado doloroso ao sermos ultrapassados por um 4x4 bem afoito. Engolimos o orgulho e continuámos devagarinho, a dar com a cabeça no tejadilho (e a fazer figas para não se furar um pneu) em direcção ao Talasnal, a mais pitoresca das Aldeias de Xisto da Serra da Lousã.
O Veado de Candal
Tinhamos começado a manhã a subir a serra em direcção a Candal, a primeira das aldeias de Xisto da Lousã que nos saltou ao caminho. Situada à beira da Estrada Nacional, tem direito a uma loja de artesanato e café, “se não for um grupo grande, porque tenho a máquina avariada”, foi-nos logo avisando a senhora da loja, uma residente local de grandes olhos azuis sorridentes, “logo havia de avariar em Agosto!”. Olhámos para a bonita aldeia deserta e sorrimos. Não parecia Agosto, por todas as razões e mais algumas. E ainda bem.
Enquanto a nossa criança brincava com o gato da casa, branco e pachorrento, ouvimos contar as aventuras do veado de Candal, um bicho velho, de longas hastes, que nunca se afasta muito da aldeia e pode ser visto ali mesmo, perto da loja, todas as madrugadas e ocasos. Como dificilmente o conseguiamos cumprimentar às 10 da manhã, fomos explorar a aldeia.
Construída numa encosta, Candal não tem propriamente ruas. As casas estão encaixadas entre degraus e ladeiras íngremes que se fundem num bloco de xisto irregular e labiríntico.
Uma série de degraus pode ir dar ao páteo arruinado de uma casa, outra a um terraço com uma fonte de água fresquíssima e outras vezes, há surpresas…
Nao vimos vivalma, mas atrás de algumas das paredes de pedra ouviam-se ruídos domésticos familiares: o tinido da loiça, o bater de um tapete, marteladas súbitas…
Deixámos Candal para trás e embrenhámo-nos na floresta. Sem veículo apropriado, são 20 minutos com o credo na boca até ao Talasnal, pela tal estrada florestal, de fraga e terra batida.
De repente, uma coruja enorme atravessa-se na estrada à nossa frente e a seguir… milagre dos milagres, um jovem veado ruivo saltita na berma e desaparece entre os fetos. Mais excitados que garotos em manhã de Natal, gritamos ao mesmo tempo: Viste?! Viste?! E rimos muito porque a bebé não viu nada, entretida a desfazer uma pinha.
Mais abaixo, tantas amoras! Gordas e docinhas, a abrir o apetite para o almoço serrano que esperávamos encontrar no único restaurante das redondezas.
Almoço com Vista
O Talasnal é talvez a mais famosa das aldeias de Xisto da Lousã. E não é só porque tem o nome mais engraçado. Empoleirada numa crista a meia-encosta, com amplas vistas para o vale, tem sido alvo de uma intensa e cuidada recuperação imobiliária. Não há reportagem de TV que não fale dos petiscos do seu restaurante. Entusiasmados, procurámo-lo… e demos com o nariz na porta. “Em manutenção”, informou-nos um vizinho. E agora? Estavamos a km da civilização! Estrada difícil e matagal por todos os lados. E a fominha que tinhamos?
Descobrimos uma lojinha de tecto baixo, “O Retalhinho”, onde um senhor despachado e simpático, desatou a abrir as gavetas do congelador e nos sugeriu cabrito para o almoço. A chegada de dois grupos de caminhantes estrangeiros mais esfomeados que nós, lançou a confusão. Acabámos todos num pequeno terraço com uma vista desumbrante a comer sopinha de feijão verde e sandochas de presunto enquanto afagávamos os gatos da casa. Huuuuumm! Divinal!
Para sobremesa, um “retalhinho”, o doce da casa que escorria um creme de castanha e amêndoa do outro mundo.
Comemo-lo enquanto percorríamos as ruas da aldeia, a admirar a recuperação das casas e as vistas. Quem não gostaria de passar férias numa casinha de bonecas daquelas e acordar naquele verde todo? A avaliar pela quantidade de carros estacionados na aldeia, muita gente veraneava por ali, apesar de não nos termos cruzado com ninguém no nosso passeio.
De regresso, antes de voltar pelo tortuoso caminho, fizemos mais uns metros na direcção da próxima aldeia de Xisto, Casal Novo, que já conhecíamos de outros Carnavais (literalmente), só para tirar a foto da signature view do Talasnal. É assim que a aldeia se apresenta para quem sobe a serra do lado da vila da Lousã.
Digam lá que não é coisa para valer uma suspensão nova?
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Nota: artigo publicado em Setembro de 2011 e destacado de novo em Março de 2014.
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Conheço bastante bem toda esta zona. Já pensei em tempos fazer um turismo rural, e dos levantamentos que fiz a serra da Lousã esteve quase a ser a melhor hipótese. Mas as imobiliárias exageram bastante. E depois acabei por adiar o projecto.
Mas estas imagens e o texto dão logo vontade de voltar a pensar nisso.
A loja das aldeias de xisto no Candal, é mesmo um cantinho especial, não é? :)
Conheço muito bem.
Parabéns pelo artigo.
E PIODAO JÁ FORAM , É LINDO E SE ACORDAREM DE MANHA E ESTIVER TUDO COBERTO DE NEVE É UMA EXPERIENCIA UNICA , ATÉ NOS APETECE CHORAR DE FELICIDADE
Cá vai o link para o site da tal casinha: http://www.casadaurze.net/
Este Verão não deve ter sido assim tão raro, Ricardo! Mas nós não nos importámos, nada! Templo nublado é melhor para as fotos e para passear...
Ainda bem que gostaste!
Ja estive na Lousa, e nao hesito em afirmar que foi um dos locais mais bonitos que visitei em toda a minha vida.
Achei o artigo muito interessante, porem achei penso tiveram muito azar com a temperatura local pois a Lousa no Verao e um sitio quente, e apanhar 13 graus em Agosto na Lousa e rarissimo.
PS: As fotografias estao espectaculares, parabens!
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