Se Fernando Pessoa fosse vivo seria, decerto, um fervoroso seguidor do MyGuide - http://myguide.iol.pt/.
Vou explicar-vos a minha tese.
Em 1988 foi descoberta na arca do poeta um manuscrito autógrafo que desvendava alguns percursos para turistas. Havia muito mais: descobriu-se uma vertente empresarial embrionária do sonhador do Quinto Império. Pessoa chegou até a projectar uma firma denominada Cosmopolis, em merecimento de uma internacionalização da sua cidade natal, que considerava vir a ser a capital mística da cultura e língua portuguesas, a sua Lisboa. O projecto de Fernando Pessoa intitulado, na língua original, Lisbon: what the tourist should see tinha um objectivo muito claro: dar a conhecer Portugal e desmistificar informações que passavam sobre o país, contra a “descategorização europeia”. Ele próprio deixou expressa a vontade de publicar um guia designado “All About Portugal” e assim o programou, mas a publicação seria póstuma [PESSOA, Fernando – Lisboa: o que o turista deve ver. Lisboa: Livros Horizonte, 1992].
Imaginem-se agora numa viagem guiada por Fernando Pessoa ao património urbano e cultural português. As sugestões de visita são retiradas desta obra de carácter técnico-turístico tendo eu própria realizado uma síntese que partilho no MyGuide.
Demos início à visita. Sintam o ritmo cadenciado e firme, bem ao estilo de Álvaro de Campos. Deixo-vos um excerto do poema, como preparação para o percurso guiado:
(…)
Hé-lá as ruas, hé-lá as praças, hé-la-hó la foule!
Tudo o que passa, tudo o que pára às montras!
Comerciantes; vadios; escrocs exageradamente bem-vestidos;
Membros evidentes de clubes aristocráticos;
Esquálidas figuras dúbias; chefes de família vagamente felizes
E paternais até na corrente de oiro que atravessa o colete
De algibeira a algibeira!
Tudo o que passa, tudo o que passa e nunca passa!
Presença demasiadamente acentuada das cocotes;
Banalidade interessante (e quem sabe o quê por dentro?)
Das burguesinhas, mãe e filha geralmente,
Que andam na rua com um fim qualquer,
A graça feminil e falsa dos pederastas que passam, lentos;
E toda a gente simplesmente elegante que passeia e se mostra
E afinal tem alma lá dentro!
(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!)
(…)
[Ode Triunfal, Álvaro de Campos]
Inquietações de um visitante e de um cidadão do mundo também comuns aos olhares dos viajantes e editores do Myguide.
Preparados? Vamos recuar. Imaginem-se em plena década dos anos 20.
Percorram a Praça dos Restauradores e decidam alugar um trem, um automóvel ou um «side-car». Esta é uma das sugestões de Fernando Pessoa. Não hesito em dar-vos a minha própria sugestão: para as senhoras – se preferirem seguir por vosso pé – vejam-se de chapéu cloche enterrado na cabeça ou, versão masculina, de chapéu alto, eventualmente de lunetas, e não esqueçam de guardar na malinha uns binóculos para a ópera da noite.
A visita de Fernando Pessoa não podia deixar de passar às portas de sua casa, aquele que é o verdadeiro centro cultural da cidade, o Teatro de S. Carlos. Refere ainda Pessoa que a Rua do Ouro é a principal rua da cidade devido ao comércio de luxo estilo parisiense. Que estilos poderíamos hoje apurar do nosso comércio? Lanço eu a pergunta…
O nosso guia convida ainda a um espectáculo animado na Praça da Figueira onde fica o popular mercado central com típicas lojas e quiosques de um lado e de outro, situadas por debaixo de uma cobertura de vidro. Hoje não existe tal estrutura e, se pesquisarmos fontes históricas vamos encontrar vários nomes que mudaram ao longo dos tempos: Horta do Hospital, Praça das Ervas e Praça Nova. Dei-me conta, actualmente, que existe na Rua do Alecrim um painel de azulejos do Século XX que retrata a Praça da Figueira de antigamente. Aqui fica um postal que encontrei na blogosfera.
Aceitando novo convite de Fernando Pessoa iremos subir a Avenida da Liberdade para nos sentarmos na parte central da Avenida, onde as confeitarias alargam o seu serviço, incluindo a música ao vivo. Hoje, já não é assim… A vida populacional de Lisboa antiga, realizada ao ar livre, mudou-se para zonas fechadas.
As propostas de Fernando Pessoa são inúmeras, passando pelo Aqueduto das Águas Livres, até ao Palácio das Necessidades. Como apêndice, traça a visita a Sintra, via Queluz.
Certamente, o estilo seco e demasiado extenso não faz desta obra uma referência maior, é no entanto, um dos guias mais comprados por turistas na Casa de Fernando Pessoa. Fazendo jus à sua criação, é um guia cuja língua original é a inglesa (com tradução para português de Maria Amélia Santos Gomes), a pensar nos estrangeiros e no que devem saber acerca desta cidade. Não tem “rio da minha aldeia” (Alberto Caeiro), mas viajamos com imensa saudade, através do percurso delineado por Fernando Pessoa.
Referência da publicação:
PESSOA, Fernando – Lisboa: o que o turista deve ver. Lisboa: Livros Horizonte, 1992
Na imagem de topo: pormenor da capa
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