CULTURA: Lenços dos Namorados, uma tradição portuguesa

Não existe em Portugal região tão rica em bordados como a do Minho. Os conhecidos "Lenços de Namorados", também designados lenços marcados, bordados ou de amor são uma dessas vertentes.


A tradição dos Lenços de Namorados é significativa nas localidades de Viana do Castelo, Vila Verde, Telões, Guimarães e Aboim da Nóbrega, apresentando, todavia, características de bordado diferente.

A chamada Arte dos Namorados é uma componente fundamental da arte e da cultura popular. Os Lenços de Namorados apresentam-se como a mais genuína forma poética e artística utilizada pelas moças do Minho, em idade de casar. Constituído por um quadrado de linho, ou de algodão, que a jovem bordadeira bordava a seu gosto, o lenço dos namorados fazia parte do traje típico feminino, mas tinha outra função a desempenhar: a conquista do jovem por quem se apaixonara.

Não há muito tempo, toda a rapariga Minhota começava muito cedo a bordar. Quando mais tarde, casadoira, os olhos teimavam em fugir-lhe para o jovem que no seu íntimo já escolhera, começava a bordar o lenço que lhe destinara, dando largas aos sentimentos mais intímos.

Era costume ensinar às raparigas a arte de bordar para que, mal entradas na adolescência, começassem a preparar o enxoval. O lenço era bordado, então, nas longas noites de serão, nos momentos livres do dia ou aquando do apastoramento do gado, pela rapariga apaixonada que ia transpondo para o lenço os sentimentos que lhe iam na alma. A jovem usá-lo-ia ao domingo na trincha da saia ou no bolso do avental; mais tarde oferecê-lo-ia somente ao rapaz que amava como compromisso de amor, este passaria a usá-lo ao pescoço ou no bolso do casaco do fato domingueiro.

É considerado o século de apogeu dos lenços de namorados o período entre 1850 e 1950. Muitos dos lenços encontram-se conservados nas famílias, mas já existem alguns em museus. Entre os textos bordados sobressaem as quadras de inspiração popular. Desde o ponto de vista linguístico constituem um documento de excepcional valor: bordados em longo trabalho por bordadeiras de escassa alfabetização, apresentam a língua popular do modo mais directo, nos seus diferentes aspectos. Os textos analisados tal como aparecem nos lenços, com todos os seus "desvios" da língua culta e da ortografia padrão, conservam assim todo o seu valor documental como testemunhos da fala popular.

Procedendo da zona setentrional de Portugal, a língua que oferecem é em grande medida idêntica com o português popular da Galiza. Algumas das quadras recolhidas nos lenços são até bem conhecidas em ambas as áreas; por exemplo a seguinte:

Aqui tens o meu coração
E a chabe pró abrir
Num tenho mais que te dar
Nem tu mais que me pedir.

Como acontece em geral na literatura popular, o valor literário das quadras é desigual, mas não falta inspiração em muitas delas:

Pergunta a quem saiba amar
Qual e mais para sentir
Se amar e viver ausente
Se ver i não possuir.

No centro deste lencinho
O teu nome está garbado
Dentro em meu coração
O teu rosto retratado.

Nalguns casos podemos suspeitar que recolhiam textos produzidos por poetas de maior formação académica:

Coração, relógio tonto!
Tuas horas sempre são
Desejos das que hão de vir,
Saudades das que lá vão!...

(Extraído e condensado de "Portal das Curiosidades")

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Comentário de Lara M em 19 Abril 2014 às 14:40

Muito interessante entendermos a história e que tudo tem uma razão de ser ;) São realmente bonitos. Ainda assim, hoje em dia copia-se esta tradição e são colocados em toalhas etc... sem dúvida alguma que o o autêntico é sempre o melhor.

Comentário de Maria do Céu Lopes Heinrich em 14 Abril 2014 às 15:58

Ah! Esqueci de adicionar o meu poema!

Abraços. Maria do Céu.

Bordado

acaricio a trama
cruzo linhas
entremeio espaços
no entra e sai
de ausências
bordo pontos
semeados
com dedos calejados
pela dor
amacio a vida
faço-a colorida
com o amor
desenho
contornos
quero-a bela
aposso-me dela
dou guarida à fantasia
sobreponho relevos
corações
verdes
botões
a perfumar
pontos cadeia
estreitar laços
adornados
de pontos cruz.
arremato
nó afiado
com saliva
doce.

Comentário de Maria do Céu Lopes Heinrich em 14 Abril 2014 às 15:56

Sou escritora e poetisa. Gostaria de usar vossa imagem do lenço para ilustrar uma poesia minha. vocês me autorizam a isso? Posso dar os créditos e mencionar o vosso site para divulga-lo, concordam?

Comentário de Joana Sá Pinto em 9 Agosto 2011 às 12:33
Acho muito engraçado, é, de facto, um marco na cultura portuguesa. Mas não conhecia a história, muito interessante!

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