Já a aurora havia rompido há um belo par de horas, quando abalei para Mourão para mais uma jornada por terras do meu Alentejo... Desloco-me por por estradas de terra chã claras, na primavera cobertas de coloridas flores, e por campos salpicados por montes, aldeias e povos. A meio da jornada, na altura pelo Redondo, o vento (e o telemóvel) desperta-me os sentidos, perdidos naquela imensidão de planícies ondulantes e no céu amplo, de um azul imaculado profundamente retemperador e libertador. É Joaquim Bação , o homem do leme da Adega Velha, que me aguarde para mais um sessão gastronómica com cante por sobremesa: «Então homem por anda? A hora do repasto não se faz esperar». Respondo-lhe que daqui a pouco lá estarei.
Percorro os últimos quilómetros até à raiana Mourão entre sobreiros e azinheiras que marcam a linha do horizonte. Monsaraz e as margens do Alqueva guiam-me a Mourão. A Adega Velha sita naquelas estreitas ruas de um Alentejo de casas caiadas de branco e janelas de ombreiras de madeira de azul pintadas. Para os meus olhos de urbano lisboeta, pouco dado à indolência do meus país de origem, àquele brilho eterno de pintado de fresco e, sobretudo, à bucólica calma que se faz sentir, lenta se torna a chegada ao meu destino.
Por fim, sem que nada o anuncie, lá encontro a Adega Velha. Cruzo as portas entreabertas. No interior, o Alentejo acolhe-me ao som do concerto para piano e orquestra de Grieg. Joaquim Bação aguarda-me de cigarrilha e copo de whisky na mão. «Que caminhos levou para a estas horas chegar?». Responde-lhe que andei a tirar "bonecos" do nosso Alentejo. «Ah! Valeu a pena a espera».
Percorro o comprido corredor, em lajes de xisto disnevalado, com talhas, guitarras e todos os tipos de fait-divers nas paredes que outrora foram brancas. à minha esquerda desfilam as quatro salas abobadadas com imponentes móveis repletos de louça tradicional, fotos e, num deles, uma impressionante coleção de antigos rádios. As paredes dão continuidade à castiça decoração: utensílios agrícolas, cartazes de touradas, telas, um sem número de artefatos que fazem da Adega um museu no qual o passado renasce em ilustradas memórias.
A primeira sala, onde impera Domingos Falé, é um típico tasco alentejano: tentadores petiscos - orelha, ovos mexidos com espargos, enchidos, e outros que tais -, têm acompanhamento de tinto da talha e licores caseiros. É também nesta sala, num fim de mais um dia de jorna que o cante, genuíno e espontâneo, se faz ouvir. Nas outras salas servem-se os acidentais comensais. Da imaginação e saber da «Presente», Maria dos Reis Pereira, nasce a selectiva degustação servida em tachos de barro: cozido de grão ("granada" como lhe chamamos no Alentejo); cacholeira assada, feijão com enchidos e carne de porco; sopa da panela; lebre guisada; perdiz à Adega Velha, etc. O peixe apenas se faz representar na excelente sopa de cação. As sobremesas são tipicamente alentejanas.
Quanto a mim fiquei-me apenas com a "granada", devido à longa conversa de três horas, aos 4 jarros de vinho para recuperar da jornada e umas quantas linguiças.
Findo o repasto dirigi-me ao balcão da tasca (a primeira sala), onde Domingos me fez provar um licor - ainda hoje desconheço de quê, - que me aconchegou os sentidos e ajudou na digestão. As histórias de Bação, a do 106, a das viúvas, a das "rameiras", decide guardá-las para as publicar em livro.
Despedi-me de Bação, depois de ter recusado os afáveis convites de pernoitar na sua herdade, para seguir para Cuba e aventurar-me a uma sopradela de balão. À saída, já a noite ia alta, e de solêncio coberta, levo comigo o cante do meu País
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